sábado, 29 de junho de 2013

Democracia possível na América Latina

BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. O Estado necessário para a Democracia possível na América Latina.
Resenha

O tema que norteia a discussão nesse artigo é o problema da democracia e da capacidade do Estado na América Latina. A partir dessa perspectiva, o autor estabelece uma relação diretamente proporcional entre a competência do Estado e a consolidação da democracia. Isto significa que, quanto mais forte política, fiscal, e administrativamente o Estado, mais consolidada será sua democracia.


Nesta discussão, o autor deixa bem claro que o conceito de “Estado” usado por ele não é o mesmo que “estado-nação”, ou seja, a unidade político-territorial; ele se refere ao Estado como Instituição, ou ainda, como “sistema constitucional-legal e a organização que o garante”. (p. 4).

Outro referencial que norteia essa discussão é o ideal das democracias no Estado moderno. Bresser resume esse ideal em cinco “pilares”, que consistem em garantir: 1) a segurança; 2) a liberdade; 3) o bem-estar; 4) a justiça social; e 5) a proteção da natureza.

Ele postula que o Estado capaz de atingir esses objetivos necessita que “internamente [tenha] um sistema constitucional-legal democrático e uma organização ou administração pública equilibrada do ponto de vista fiscal, e competente do ponto de vista administrativo; externamente [...] contar com a legitimidade derivada do apoio da sociedade civil ou da nação”. (p. 4).

Outro conceito muito importante desenvolvido por ele, é o de sociedade civil, ou seja, a sociedade politicamente organizada, responsável pela busca de “liberdade, justiça social e proteção do meio ambiente”. (p. 5), que ele aponta como tendo papel decisivo na luta pela democracia na América Latina. Nesse ponto, ele postula também que, “para termos um Estado democrático precisamos de uma sociedade civil democrática”. (p. 6).

Historicamente vista com desconfiança pelos estadistas e filósofos, a democracia, hoje, “É o regime político que melhor assegura a consecução dos grandes objetivos políticos das sociedades modernas”. (p. 6). Ele observa ainda, que o regime democrático é a forma que o Estado moderno assume.

É importante notar a associação que o autor faz entre a prosperidade (estabilidade) econômica e desenvolvimento político, à maior efetividade e maior participação da democracia (p. 6). Por essa razão, países pobres enfrentam maiores dificuldades em consolidar suas democracias.

Muito vinculada a essa ideia de prosperidade econômica está a associação que o autor estabelece entre o desenvolvimento da democracia e do Estado com a revolução capitalista. Isto porque, segundo ele a revolução capitalista transforma a economia, a sociedade e a política. (p. 6).

O autor traça uma linha do tempo da evolução do Estado moderno, a saber: Estado Absoluto (Séc. XVI - XVIII), Liberal (Séc. XIX), Democrático Liberal (Séc. XX), e Democrático Social (2ª metade do Séc. XX, nos países europeus).

Ele observa que também aconteceu uma evolução do Estado nos países da América Latina. Essa evolução, porém não aconteceu na mesma medida e da mesma forma, pois esses países tinham grandes desvantagens políticas e econômicas em relação aos demais países que experimentaram a evolução acima descrita, pois eram colônias e eram pobres. Dessa forma, após suas respectivas independências, deram lugar, não a um Estado Liberal, mas ao Estado Desenvolvimentista, com regime ainda autoritário.

Nesses países, ao invés do Estado Absoluto, tem-se o Estado Oligárquico durante mais de um século, passando, então para Estados Desenvolvimentistas no Séc. XX, com a revolução capitalista, porém ainda sob regime autoritário.

Considerando que, nem mesmo os países ricos, e que vivenciam um estágio democrático bastante avançado e consolidado, estão satisfeitos com o padrão democrático que alcançaram; e, considerando ainda, que o padrão estabelecido para se considerar um país democrático varia de acordo com interesses políticos e econômicos, o autor adota um conceito mínimo de democracia, que consiste na garantia: 1) das liberdades; 2) do sufrágio universal; e 3) da alternância de poder. Além disso,  também é otimista quanto à evolução da democracia, ou seja, através de um desenvolvimento político ela se torna mais representativa e mais participativa. (p. 8), e cita como exemplo desse desenvolvimento, as democracias da Europa, configurada como de opinião pública e social.

Ainda nessa lógica, ele desenvolve o conceito de Democracia Possível. Para ele, a consolidação da democracia está condicionada a alguns fatores cruciais, a saber: 1) contar com o apoio da sociedade civil (legitimidade); 2) desvincular o público do privado; 3) liberar o Estado do controle direto das elites; 4) passar o excedente econômico a ser apropriado na economia de mercado, através do lucro; 5) alcançar o estágio em que a revolução capitalista se completa com a industrialização. (p. 9).

É curioso notar que, apesar de o capitalismo ser um regime econômico fortemente criticado pelas injustiças sociais resultantes de sua lógica perversa, segundo Bresser (p. 11) “A consolidação da democracia, [...] depende de o país haver completado sua revolução capitalista”.

A ausência desses fatores, a pobreza e o baixo nível de educação política do povo caracterizam os chamados Estados “fracassados” ou “fracos”.

O autor discorre sobre o populismo, como “uma forma muito primitiva de participação política popular”. Nessas democracias emergentes, a resistência das elites ainda é grande, e busca desacreditar e “derrubar”  o líder popular, para voltarem a ter o controle direto do Estado, ameaçando, assim, a “democracia possível” nesses países.

Bresser ressalta, porém que “a possibilidade de que o líder populista faça um bom governo é pequena”. Isto porque a conjuntura social, política e econômica, ou seja, o baixo nível de educação e de consciência política, e o endividamento do Estado,  não favorecem. Esse contexto tem sido propício a golpes de Estado. 

Qualidade da democracia   

Bresser argumenta que “Se os cinco objetivos políticos fundamentais das democracias são segurança, liberdade, bem-estar, justiça-social e proteção do ambiente, um país será tão mais desenvolvido e tão mais democrático quanto mais equilibradamente se aproximar desses ideais. Uma democracia será tão mais desenvolvida quanto mais representativa e participativa senão deliberativa for”. (p. 18).

Ele se ancora no critério mínimo para se considerar um determinado regime como democrático, a saber: “Se nele há respeito às liberdade civis ou ao Estado de direito, se as eleições são livres e competitivas, e se há alternância de poder”. (p. 19). 

Estado capaz e republicano  

Bresser desenvolve o conceito de Estado capaz e republicano, caracterizando-o como um estado forte e capaz, voltado ao desenvolvimento econômico, político, social e ambiental. Que tem sua democracia consolidada, pois conta com legitimidade perante a sociedade civil, possui finanças saudáveis e administração efetiva e eficiente, e onde há garantia crescente dos direitos sociais. E ainda, que possui instrumentos internos que defendem “a coisa pública” da ação corrupta de indivíduos e organizações, ou seja, é capaz de defender o patrimônio público.

Por essa razão, para ele o grande desafio da maioria dos países latino-americanos para consolidar suas democracias é a pobreza.

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